HISTÓRICO DOS CLUBES PARADESPORTIVOS E O DESENVOLVIMENTO DA FORMAÇÃO DE ATLETAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL

João Batista Carvalho e Silva

Prof. Dr. Sileno Santos

Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos

Introdução

Resgatar aspectos históricos da fundação de clubes para prática esportiva de pessoas com deficiência é importante para entender o sugimento do movimento Paralímpico Brasileiro. Reconhecer as personalidades e instituições, que desde 1958 trabalham para conquistar oportunidades de melhoria na vida de pessoas com deficiência, através do esporte, é enaltecer e dar mais brilho ao movimento paralímpico, que hoje se expande em termos conceituais para a prática esportiva voltada às pessoas com algum tipo de deficiência. Neste sentido, registrar o processo de formação de clubes de prática esportiva para pessoas com deficiência e sua importânica para a formação de atletas no Brasil, passa a ser o objetivo deste texto.

Início

No Brasil, o esporte para pessoas com deficiência teve origem em 1958, com a fundação dos dois primeiros clubes de pessoas com deficiência: o Clube do Otimismo, criado por Robson Sampaio de Almeida, no Rio de Janeiro;  e o Clube dos Paraplégicos de São Paulo – CPSP, fundado por Sérgio Seraphin Del Grande, na cidade de São Paulo. A prática do basquetebol em cadeiras de rodas era a modalidade inicialmente praticada nesses clubes, servindo de motivação para que mais e mais pessoas com deficiência se envolvessem com a  prática esportiva. 

Em 1964, surgiu, de uma dissidência política com o Clube do Otimismo, o CAIF – Centro de Amparo ao Incapacitado Físico, que desde a sua fundação em 1964 tem sede no bairro da Piedade, na cidade do Rio de Janeiro. Na década de 70, novos clubes de pessoas com deficiência surgiram em todo o Brasil. Assim, foi fundada em 1973 a Associação dos Deficientes Motores de Pernambuco e o CLAM – Clube dos Amigos da ABBR (Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação), criado por pacientes com lesão medular que desejavam praticar esportes de forma integrada ao processo de reabilitação, como, aliás, nasceu o esporte para pessoas com deficiência no mundo, em 1945, pelas mãos do Dr. Ludwig Guttmann.

Em 1974, com o mesmo espírito do CLAM, surge a SAHBRI (Sociedade Amigos do Hospital Barata Ribeiro) também na cidade do Rio de Janeiro, que seria no início da década de 80 incorporada pela SADEF – Sociedade Amigos do Deficiente Físico.

Em 1977, no Rio Grande do Sul surge a ARPA – Associação Riograndense dos Amputados e Paralíticos. Ainda na segunda metade da década de 70, o esporte para pessoas com deficiência continua seu crescimento. Em 1979 surge a ADM – Associação dos Deficientes Motores do Ceará, a Associação dos Deficientes Físicos de Brasília e o Clube Esportivo Sobre Rodas, em Pernambuco.

Em 1981, a ONU estabelece o Ano Internacional do Deficiente, que possibilitou o aumento do número de associações de pessoas com deficiência no Brasil. Neste ano, a palavra de ordem era: “NADA DE NÓS, SEM NÓS”; uma clara evidência que as pessoas com deficiência queriam falar com suas próprias vozes. Nessa ocasião, surgiram muitas associações que não tinham apenas o objetivo de organizar as atividades, mas, também,  se engajar em lutas políticas por mais oportunidades às pessoas com deficiência. O resultado desse movimento e das reinvindicações se concretizou, especialmente, com a promulgação da Constituição Federal de 1988.

Com o surgimento de mais clubes e associações de pessoas com deficiência, o esporte ganhou nova dimensão e oportunidades, o que resultou na primeira participação do Brasil nos  Jogos Paralimpícos, em 1972, na cidade de Heidelberg (Alemanha). Da primeira medalha conquistada por Robson Sampaio de Almeida e Luis Carlos Curtinho em 1976, nos Jogos Paralímpicos de Torongo no Canadá, há um salto quantitativo e qualitativo, visto nos Jogos Paralímpicos de 1984, que foram realizados em duas distintas sedes: Nova York para Cegos e Paralisados Cerebrais e Stoke Mandeville (Inglaterra) para pessoas com deficiência física. Nestes jogos, o Brasil alcançou a marca de 28 medalhas, sendo 7 de ouro, com atletas formados em clubes e associações exclusivamente de pessoas com deficiência.

Da fundação do Comitê Paralímpico Brasileiro

Em 1995 é criado o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), tendo o Sr. João Batista Carvalho e Silva, como seu primeiro presidente.  Neste mesmo período, o esporte para pessoas com deficiência vê aumentar, além da quantidade de medalhas, o número de praticantes e simpatizantes da causa paraolímpica, que passaram a exergar o potencial esportivo das pessoas com deficiência mais do que a deficiência em si.

Foi com o nascimento CPB que o desporto das pessoas com deficiência foi reconhecido pela Legislação Brasileira. A Lei 9.615 de 1998 reconheceu o Comitê Paralímpico Brasileiro como integrante do Sistema Nacional do Desporto, no mesmo nível em que já era reconhecido o COB – Comitê Olímpico do Brasil. Em 2001, com o sucesso Brasileiro alcançado nas Paraolimpídas de Sidnei, pelos atletas com deficiência formados em clubes e associações exclusivas de pessoas com deficiência, houve a promulgação da Lei 10.264 de 16 de julho de 2001, que contemplou o CPB com recursos advindos das Loterias. Em 2004, já com os recursos das Loterias, o Brasil alcança a 14º posição no ranking de medalhas dos Jogos Paralímpicos de Atenas, melhorando ano a ano o desempenho nos jogos subsequentes.

Da aplicação dos recursos das Loterias no esporte para pessoas com deficiência

Em 2011, a Lei 12.395 incorpora o CBC Comitê Brasileiro de Clubes – CBC (Olímpico), entre os beneficiários dos recursos das Loterias para o fomento do esporte. Do recurso total das Loterias destinado ao CBC, 85% devia ser destinado a formação de atletas Olímpicos e 15% para a formação de atletas paraolímpicos.  O objetivo desta lei era oportunizar que clubes de natureza olímpica pudessem formar atletas (olímpicos e paralímpicos) para o Brasil.

Apesar da Lei determinar a aplicação do percentual de 15% (quinze por cento) na formação de atletas paraolímpicos, pouco fez o CBC para que isto acontecesse, e jamais oportunizou que clubes ou associações exclusivas de pessoas com deficiência tivessem acesso aos recursos da lei. Ao invés de incentivar e aplicar os recursos nos clubes e associações de pessoas com deficiência, o CBC optou por fazer repasses para que clubes olímpicos pudessem fazer aquilo que desde 1958 era feito por clubes e associações de pessoas com deficiência: formar atletas com deficiência. O resultado da escolha do CBC foi que ao longo de 10 anos, pouco, para não dizer quase nada, foi aplicado para a formação de atletas com deficiência no Brasil.

Em 2018, a Lei 13.756, tentou corrigir a impossibilidade de acesso dos clubes e associações de prática esportiva para pessoas com deficiência aos recursos das Loterias. Esta lei determinou que o CBC não poderia impedir a participação de associações de qualquer natureza (Olímpica ou Paralímpica), de participar de seus editais de descentralização de recursos, mesmo que, ao CBC, não fossem filiados.

A participação do CBCP na correção da aplicação dos recursos para a formação de atletas com deficiência

Apesar do dispositivo da lei, o edital no. 8, lançado em 2020 pelo CBC, não oferecia acesso para que clubes e associações de natureza paralímpica, pudessem pleitear a utilização dos recursos para a formação de atletas com deficiência. É a partir desta situação que surge o Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos – CBCP, para corrigir uma falha na legislação em simitria ao sistema Olímpico/Paraolímpico.  Com essa correção, o CBCP gerenciará o acesso de forma democrática aos recursos das loterias, visando a formação de atletas com deficiência.

O CBCP possui apoio do Comitê Paralímpico Brasileiro, do Comitê Olímpico do Brasil e do próprio Comitê Brasileiro de Clubes, além de diversas confederações que manifestaram seu entendimento positivo no pleito de ver o CBCP reconhecido como membro integrante do Sistema Nacional do Desporto.

Considerações Finais

O presente texto reforçou que foram os resultados dos atletas formados pelos clubes de pessoas com deficiência que possibilitaram ao CPB receber recursos das loterias, proporcionando a mudança da história do esporte das pessoas com deficiência no Brasil. Esse resultado fica muito claro quando se observa que, no Brasil, atletas são formados pelas entidades de prática esportiva, e no nosso caso, nas entidades de prática esportiva para pessoas com deficiência.

É com esse pensamento que o CBCP pretende direcionar seus esforços para que as associações, clubes e entidades de prática esportiva para pessoas com deficiência possam assumir o protagonismo da formação de atletas com deficiência nas mais diversas regiões de nosso país.

Para isso, um dos focos do CBCP será o aprimoramento da gestão dos clubes e associações de prática esportiva para pessoas com deficiência. Além disso, apoios estragégicos direcionarão esforços conjuntos com as entidades de administração desportiva, para a consolidação do Brasil como potência paradesportiva e paraolímpica no cenário mundial.

Referências

ABBR. Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação. Histórico. Disponível em: https://www.abbr.org.br/abbr/historico/historico.html Acesso em: 07 out 2020.

ADD Associação Desportiva Para Deficientes. O legado paulista ao esporte paralímpico. São Paulo. Aurea Editora. 2016.

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_________. Lei nº 10.264 de 16 de julho de 2001. Acrescenta inciso e parágrafos ao art. 56 da Lei no 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto. Brasília, DF, 16 jul. 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10264.htm. Acesso em: 10 out. 2020

________ Lei nº 12.395 de 16 de novembro de 2011. Altera as Leis nº s 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto, e 10.891, de 9 de julho de 2004, que institui a Bolsa-Atleta; cria os Programas Atleta Pódio e Cidade Esportiva; revoga a Lei nº 6.354, de 2 de setembro de 1976; e dá outras providências. Brasília, DF, 16 nov. 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12395.htm. Acesso em: 10 out. 2020.

________ Lei nº 13.756 de 12 de dezembro de 2018. Dispõe sobre o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), sobre a destinação do produto da arrecadação das loterias e sobre a promoção comercial e a modalidade lotérica denominada apostas de quota fixa. Brasília, DF, 12 dez. 2018. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13756.htm. Acesso em: 10 out. 2020.

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